
Os dias tem-me sido estranhos ultimamente. Em último, penso, seja talvez pelo retorno às coisas das quais esquecera-me. Meu coração. Sei que essas palavras são apenas letras amontoadas. São coisas pequenas que às vezes tenho dito. Sinto que elas têm sido cada vez menos significativas para mim. É como se eu abandonasse parte de mim. Não me refiro a coisas que tive e perdi. Ou àquelas das quais abri mão. Estive pensando.
Eu sinto como se fossem coisas diferentes hoje. Eu as vejo diferentemente, pelo menos. Não sei se o mundo de fato muda, ou se são as lentes dos meus óculos que passam a ver graus diferentes de luz. É como se nada de novo fosse. Repito esses versos em minha cabeça de vez em quando. Meus poemas não são o que eu desejei. Talvez nunca se tornem isso. Tenho escrito coisas inúteis, por vezes… lido muitas coisas ainda piores. Tenho ouvido músicas melhores.
Ainda assim, há algo fora do lugar em todos esses dias. Há muitos, de fato. Mas não é a mesma coisa. Não é a mesma ausência de meus doze anos, eternamente poetizada em um porto de lonjuras. Parece-me que aquilo muito posto para fora já foi. Mas a incompletude permeia o que sinto em meus dias. Sei-me das impossibilidades das inconsistências do que não tenho feito. De meus compromissos adiados, pela insatisfação de ter de fazê-los. São atividades mortas para mim.
Sinto-me desapaixonado. Como se a chama por fazer coisas que por anos quis estivessem agora apagadas. São chamas pequenas que se sopraram com o vento. Não sei fazer imagens poéticas delicadas como aquelas que os grandes escritores fazem. Nem sequer sou capaz de escrever um diário, por mais que textos como esses pareçam
ser um. Percebo que sou uma iniquidade. Palavra difícil esta, mas que gosto, pois expressa exatamente isso. Algo fora do lugar, fora da ordem, da lei.
A beleza de minha língua portuguesa tão limitada, por onde meus conterrâneos brasileiros não leem. Aqueles do sangue que possuo em lugar além do mar nem sequer
sabem de mim. Talvez seja muito também disto, o desejo de ser visto. Como se ocultar-
me do mundo pudesse fazer com que outras pessoas vissem-me também. Lembrei-me de coisas pelas quais chorei há muito tempo. Canções que ouvi e que me fizeram escrever.
Para que serve este dom que possuo? Chamam-no de dom, de fato, mas de que serve um dom se ninguém o verá? Talvez seja assim que deva ser. Esquecido do mundo, frágil linha de memória. Não sinto falta de lançar-me no mundo, de fato. Deveras! Que há para mim neste mundo? Que poderia haver no mundo? Só há terra. Poeira neste mundo. Haverá para mim outro mundo? Talvez o mar… Achei que haveria mundo em amar, mas há mar. Profundo mar, azul.
Minhas palavras insensatas pouco lidas, pouco ouvidas, descabidas e inacabadas. Penso em compartilhá-las para o mundo, como se o mundo fosse assim ouvir-me. Talvez eu as grave num vídeo, ou as publique numa página que ninguém lê. Talvez eu as guarde numa gaveta para sempre. Talvez eu compre uma máquina de escrever. Sinto que eu deveria outras coisas produzir, mas elas também são inúteis ao mundo.
Talvez seja esse o sentimento. Talvez seja por saber que não sou útil a este mundo e que ele jamais precisará de mim. Sou tão pequeno para este mundo. Ah… ainda assim eu não caibo neste mundo. Falta nele algo para conter-me. Para fazer-me eu, no mais íntegro dos sentidos. Talvez assim eu encontre o que me falta, mesmo sem esperanças para encontrar. Neste pequeno mundo de incerteza, cercado de insensatez.
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