Acordo-me na solidão dos dias
Como o mar na praia deserta
Minha vida em saudades vazias
Minha vontade agora tão incerta
Acordo-me nos meus dias tão só
Marcando o compasso do tempo
Minha linha a desatar o laço do nó
Atado num momento pequeno
Acordo-me toda semana igual
Meu poema antigo, guardado
Meu verso desamarrado final
Um desejo de vento soprado
Acordo-me nas tardes tão quentes
Nas marés dos rochedos solitários
Minha viagem da mente que sente
O pensamento de vazios contrários
Acordo-me nas madrugadas azuis
Ao brilho da prata soturna e ligeira
Meus olhos no vitral que reluz
Aurora de ânsia da vida primeira
Acordo-me na infância de alma derradeira
A vida que passa num tempo apagado
A memória dos choros pela minha mamadeira
A saudade do tempo que não tenho passado
Acordo-me nos braços cálidos de amor
A desatar os cabelos tão bagunçados
Os dedos que traçam a linha do meu torpor
Em meus poemas de mil versos encerrados
Acordo-me nas páginas alvas de livro
Por onde me perco ao navegar tão lento
Perdido a atravessar estas palavras no meu crivo
Onde deságuam minhas saudades no desalento
Acordo-me num coração que pulsa
Recordando as cores dos lábios vermelhos
Minha alma de memórias e glórias avulsa
Por entre um corredor de manchados espelhos
Acordo-me na métrica imperfeita
Como a fita de um laço de cabelo
Numa linha escura de arte que enfeita
A sacada de teus olhos ao meu desvelo
Comments