
Eu gostaria que você visse a minha dor
Que pudesse perceber o que eu sinto
Que então seria mais profundo terror
Da agonia deste mundo em que existo
Eu gostaria que você sentisse como eu
Que soubesse como é este mundo meu
Eu não sei mais como me encontrar
Nas madrugadas tão longas a passar
E estes meus olhos de vidros quebrados
Nas lembranças dos teus perfumes
Como a beleza de mortos vaga-lumes
Na saudade de meu leito desmanchado
Eu gostaria que você olhasse dentro de mim
E pudesse ver a profundeza destes meus dias
Como um abismo a encarar a vida à frente
Com esta dor que me aperta o coração rente
Mas às vezes acho que você também não sente
Como o homem meu pai também não sentia
E assim me desce no rosto a lágrima vazia
De perceber que sou neste mundo indigente
Eu gostaria que você não fosse indiferente
Que também padecesse deste meu penar
Quem sabe assim veria que sou alguém
E que há mais para mim do que desdém
Mas quando estou tão só nestas noites obscuras
Preenchido nos olhos de profundas agruras
Sinto-me desmontado das saudades que sinto
E delas, por elas, em mim, eu jamais minto
Se em verdade quero que você sinta
Não pela pena ou pela triste vingança
Mas para ver a realidade dos meus olhares
A se desmancharem quando choro milhares
E se você não fosse tão míope quanto eu
Veria na tamanha distância deste olhar
O quão quebrado estou há tanto tempo
Que não sei mais como ser de outro intento
Eu gostaria que você visse no meu peito a dor
E que pudesse olhar para ela com algum amor
Pois são as palavras mais fáceis de se rimar
Mas são as mais impossíveis de tolerar
Comments